Após derrotas no Congresso e com receio de novos reveses, o Palácio do Planalto decidiu abandonar o discurso que pregava o fim do loteamento de cargos para obter apoio a projetos no Legislativo.
O presidente Jair Bolsonaro foi convencido por ministros da área polÃtica de que premiar partidos leais a suas propostas seria a única forma de aprovar reformas sem ter de negociar a cada votação com os congressistas.
Como Bolsonaro não abre mão de manter controle sobre o comando dos ministérios – num contraponto a seus antecessores -, a negociação com o Congresso vai envolver cargos do governo federal nos Estados. São cerca de 15 mil postos comissionados de confiança. A mudança também agrada os polÃticos que buscam reforçar o prestÃgio em suas bases eleitorais.
Levantamento feito pelo jornal O Estado de São Paulo mostra que o governo já considerava as indicações polÃticas no preenchimento de cargos. De um total de 102 nomeações para superintendências estaduais feitas entre janeiro e 15 de setembro, 50 já foram fruto de indicações polÃticas – envolvendo, em grande parte, os partidos que compõem o Centrão, que ganharam postos com influência e orçamentos robustos. Do restante dos cargos, 22 foram ocupados por militares e 30 por servidores de carreira.
O governo reconhece, porém, que essa distribuição foi feita sem controle e precisa agora ser melhor organizada. Ao consultar um polÃtico que ocupou várias pastas na Esplanada no passado, um ministro ouviu um conselho que mudou de vez a orientação do governo. O diagnóstico foi o de que a chamada “velha polÃtica” vive hoje o “melhor dos mundos”, porque manteve os cargos com poder de comando nos Estados, não é cobrada a dar resultados em votações e ainda pode falar mal do governo.
Como não tem o mapa completo de cargos e padrinhos polÃticos, o Planalto decidiu fazer um levantamento geral e destacou servidores para montar uma lista atualizada que vincule os comissionados aos parlamentares que os indicaram. Os pedidos de cargos têm sido direcionados para a equipe do ministro Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, responsável pela articulação com o Congresso.
Distribuição de cargos é polÃtica republicana, afirma ministro
Em entrevista ao jornal, Ramos comparou as indicações a uma espécie de dote de Bolsonaro para um “casamento” com o Congresso. Mas destaca que é preciso “fidelidade” como contrapartida. “Após seis meses, o presidente identificou que havia muitas pessoas nomeadas que não estavam alinhadas com governo”, disse Ramos, acrescentando que “(a distribuição de) cargo é uma polÃtica republicana”.
O descontrole já fez o Planalto passar por apuros. O próprio ministro Ramos se surpreendeu ao descobrir que desagradara uma senadora considerada “importantÃssima” pelo governo.
A pedido da bancada sul-mato-grossense, liderada pelo senador Nelsinho Trad (PSD-MS), o Ministério da Cidadania havia demitido a arquiteta Maria Clara Scardini, superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e ArtÃstico Nacional (Iphan) no Mato Grosso do Sul. Em seu lugar, entraria o historiador Eldo ElcÃdio Moro.
Ocorre que Maria Clara é ligada ao MDB, da senadora Simone Tebet, e estava no cargo desde o governo Michel Temer. Ao descobrir, o ministro da Secretaria de Governo mandou tornar sem efeito a exoneração para não se desgastar com a senadora, que preside a Comissão de Constituição e Justiça do Senado.
Prioridades de Bolsonado passam pelo Senado
O governo também tem se desdobrado para desarmar “bombas” que aparecem na Câmara, como a ameaça de criação de uma CPI para investigar vazamentos da Lava Jato – por enquanto enterrada. Mas as prioridades do presidente Bolsonaro, atualmente, passam pelo Senado. A preocupação, no momento, é aprovar a reforma da Previdência e a indicação de seu “filho 03”, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), para a embaixada do Brasil em Washington. Os dois assuntos estão no Senado.
A crise dos últimos dias, provocada pela operação da PolÃcia Federal que na quinta-feira vasculhou gabinetes do lÃder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE,) e do filho dele, o deputado Fernando Filho (DEM-PE), alertou o Planalto. Na avaliação de auxiliares de Bolsonaro, o andamento da agenda do governo no Congresso pode enfrentar novas dificuldades.