Centenas de manifestantes, atrizes famosas e entidades feministas realizaram um protesto no sábado, em Paris, para denunciar o aumento da violência conjugal no país, conscientizar a sociedade e exigir uma ação mais dura contra os feminicídios na França. Foram respeitados 74 segundos de silêncio em homenagem às 74 mulheres assassinadas, desde o início do ano, por seus maridos ou ex-companheiros, um número em alta em relação a 2018. A média nos últimos dez anos era de 140 crimes por ano. Somente na semana passada, quatro mulheres foram assassinadas em casos deviolência doméstica .
No Brasil , os números são ainda mais estarrecedores. A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) chegou a manifestar preocupação quanto à elevada incidência de assassinatos de mulheres no país no início deste ano. Segundo a comissão, em 2019, 126 mulheres brasileiras foram mortas em razão de seu gênero apenas até o início de fevereiro, além do registro de 67 tentativas de homicídio.
‘É um massacre’
Na França, em 21 de junho, Nicole Belloubet, Ministra da Justiça, solicitou uma investigação pela Inspetoria Geral de Justiça para examinar registros históricos em busca de sinais de alerta que poderiam ter sido negligenciados e identificar erros e falhas ocorridos.
De acordo com dados do Ministério do Interior, 130 mulheres foram investigadas em 2017 por assassinato pelo marido ou companheiro. Em 2016, foram 123. “É um massacre”, disse Julie Gayet, atriz francesa e parceira do ex-presidente francês François Hollande, no protesto.
“Precisamos aumentar a conscientização sobre o que está acontecendo hoje, o que isso significa para a evolução da sociedade. Foi dado um passo para trás e ainda mais mulheres estão morrendo hoje.”, disse.
No último fim de semana, o tema chegou às paginas do “Le Monde”, um dos jornais mais importantes da Europa, que deu manchete em sua edição impressa e publicou extensa reportagem dominical sobre o tema. Em editorial, o periódico francês denunciou que a violência contra as mulheres se banalizou no país, “como se a sociedade admitisse sua impotência”.
No Twitter, a ministra francesa de Igualdade de Gênero, Marlene Schiappa, disse que apoiava a manifestação. “Compartilho a raiva das vítimas e de seus familiares e reitero meu apoio a essa luta e à determinação do governo”, ela tuitou. Os grupos de defesa da mulher na França têm feito mais ações nos últimos dias, exigindo que o governo mantenha sua igualdade de gênero e aja decisivamente contra a violência doméstica.
‘Parem com os feminicídios‘
Gritando “Chega” e carregando cartazes dizendo “Parem com os feminicídios” ou “O planeta precisa de mulheres vivas”, uma multidão se reuniu na Praça da República, em Paris. O mais recente caso registrado de mulher assassinada pelo companheiro na França foi vítima de uma martelada, no final de junho, e, uma locaidade perto de Lyon, enquanto suas duas filhas dormiam.
Em mensagem dirigida ao presidente Emmanuel Marcon as manifestantes pediram “o fim do massacre” feminino e ação enérgica e urgente contra a violência doméstica. Também pedem para o governo tomar medidas como pedir a guarda de crianças de suspeitos de matar a parceira já durante as investigações, e de criar um programa voltado para abertura de abrigos para vítimas de violência doméstica.
‘Emergência humanitária’
Como medida de proteção, o Ministério da Justiça pretende apresentar ao Legislativo em outubro projeto de lei exigindo o uso da tornozeleira eletrônica antes mesmo da condenação de homens considerados perigosos, medida já tomada na Espanha.
A reportagem do “Le Monde” diz que o aumento dos casos de feminicídio na FRança se tornou uma questão política. O senador Laurence Rossignol, ex-ministro das Famílias, Crianças e Direitos das Mulheres do governo socialista de François Hollande, afirmou na quinta-feira, no Senado: “Estamos em uma situação de emergência humanitária. O governo deve ir além de denunciar casos no Twitter, que não salva ninguém. Esta parece ser a famosa ‘grande causa nacional’ cujos resultados não são claramente vistos”.
Um relatório de 2018, assinado por várias associações feministas e pelo Conselho Econômico, Social e Ambiental da França, intitulado “Onde está o dinheiro para combater a violência contra as mulheres?”, já informava que 506 milhões de euros seriam necessários a cada ano para apoiar as mulheres vítimas de violência doméstica, mas apenas 79 milhões estão atualmente disponíveis no orçamento federal. A Espanha, frequentemente citada como bom exemplo, gasta 200 milhões de euros todos os anos na proteção de mulheres vítimas.
O Globo