O projeto de cães-guia do Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal (CBMDF) avança em ritmo acelerado e promete transformar a vida de pessoas cegas ou com baixa visão. A expectativa da corporação é que, a partir de 2027, sejam entregues cerca de 20 cães-guia por ano, ampliando de forma expressiva o alcance da iniciativa.
Para isso, o CBMDF reforça o chamado a famílias voluntárias interessadas em participar da etapa de socialização — fase fundamental no desenvolvimento dos filhotes antes do treinamento técnico.
Nova geração de filhotes e canil totalmente reformado
Em outubro, o canil do CBMDF recebeu três novos moradores: os filhotes da cadela Mila, que sobreviveram a um parto difícil. Com pouco mais de um mês de vida, crescem em um ambiente completamente reformado para dar suporte à expansão do projeto.
A reestruturação do canil reorganizou espaços, ampliou o conforto, a higiene e os estímulos necessários ao desenvolvimento dos cães desde o nascimento até as etapas de socialização e treinamento especializado.
A importância da socialização: o primeiro passo para formar um cão-guia
Os filhotes permanecem no canil até completarem 90 dias, quando seguem para a casa de famílias socializadoras. Lá, passam de dez meses a um ano vivendo em ambiente doméstico, convivendo com pessoas, ruídos, trânsito, transporte público e diferentes estímulos cotidianos.
Sem essa etapa, os cães teriam dificuldade para lidar com situações reais.
O coordenador do projeto, major João Gilberto Silva Cavalcanti, explica:
“A convivência familiar prepara o filhote para o mundo real. Para o cão-guia, é indispensável: o trabalho exige sensibilidade, adaptação e interação plena com humanos.”
Hoje, o CBMDF conta com dez cães em socialização: sete pastores-alemães, um golden retriever e um labrador. Uma das inovações do projeto é o uso do pastor-alemão, raça pouco comum como cão-guia no Brasil, mas amplamente empregada com sucesso em outros países.
Como funcionam os critérios para escolher as famílias
A psicóloga voluntária Fernanda Debattisti explica que o primeiro critério é a adequação do ambiente. Casas são preferíveis, mas apartamentos também podem ser aceitos, desde que haja condições de conforto e segurança.
Outro ponto crucial é a disponibilidade de tempo:
As famílias precisam incorporar o filhote na rotina diária — caminhadas, passeios, deslocamentos em transporte público, ida ao trabalho, faculdade e espaços de lazer.
“Não queremos apenas o acolhimento. Queremos o tempo da família dedicado ao cachorro”, reforça Fernanda.
Não é necessário ter experiência prévia com cães. Famílias com outros animais também podem participar, desde que o ambiente seja adequado.
O projeto fornece ração mensal, acompanhamento veterinário e suporte técnico. Gastos extras são opcionais.
A vida transformada de quem recebe um cão-guia
Do outro lado do processo estão as pessoas que aguardam ansiosamente um cão-guia.
O analista de qualidade Esio Cleber de Oliveira Júnior, 28 anos, esperou sete anos na fila — inscreveu-se em 2014 e recebeu o cão Baré em 2021.
Para ele, o impacto é direto e profundo:
“O cão-guia me dá segurança. Hoje posso andar na rua sem medo de buracos ou obstáculos inesperados.”
Além da mobilidade, Esio destaca a inclusão social proporcionada pelo cão:
“Com a bengala, as pessoas veem primeiro a deficiência. Com o cão-guia, veem o cachorro — e isso muda tudo. É inclusão através do cão.”
Treinamento técnico rigoroso e formação de novos treinadores
Após a socialização, o cão retorna ao canil para o treinamento formal.
O processo inclui:
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Obediência básica
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Comandos de segurança
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Treinamento em corredores, simulação de riscos e, por fim, deslocamentos reais nas ruas
O compromisso do CBMDF é entregar cães de excelência, e não apenas “bons”. Um erro pode colocar em risco a vida do usuário.
Para atender à demanda crescente, a corporação lançará em fevereiro um curso próprio de formação de treinadores, com duração de dois anos. Serão dez alunos: seis militares e quatro civis.
Expansão do projeto: cães também atuarão em salas de recursos para crianças com TEA
Como desdobramento da iniciativa, o CBMDF começa a integrar os cães a ações pedagógicas em escolas cívico-militares, em parceria com a Secretaria de Educação do DF.
A partir do próximo ano, os animais atuarão como mediadores afetivos em salas de recursos para crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA).
O objetivo é proporcionar acolhimento, tranquilidade e facilitar a interação social, reduzindo barreiras e fortalecendo vínculos entre alunos e comunidade escolar.
