Em depoimento à CPI dos Atos Antidemocráticos da Câmara Legislativa nesta quinta-feira (22), o general do Exército Marco Edson Gonçalves Dias, ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República, negou ter sido conivente com os golpistas que invadiram o Palácio do Planalto no dia 8 de janeiro. O general também negou ter adulterado relatórios da Abin que foram enviados ao Congresso Nacional, ao Ministério Público Federal e ao Ministério Público Militar.

Durante a sabatina do general, que durou aproximadamente cinco horas, os deputados distritais membros da CPI fizeram vários questionamentos sobre a atuação do então chefe do GSI desde o dia 1 de janeiro, quando assumiu o cargo, até o dia 8 de janeiro de 2023, data da tentativa de tomada de poder. “Em novembro de 2022 fui convidado para assumir o GSI e tomei posse no dia 1 de janeiro. No dia 8 de janeiro, defendi o palácio presidencial no meio de um levante antidemocrático”, afirmou o general à CPI.

O general G. Dias, como é conhecido no meio militar, também revelou à comissão que o GSI não foi convidado para a reunião realizada no dia 6 de janeiro na Secretaria de Segurança Pública do DF (SSP-DF) que definiu o Protocolo de Ações Integradas (PAI) das forças de segurança para atuação nos protestos. “A SSP-DF realizou uma reunião no dia 6 de janeiro com diversos órgãos e setores encarregados da segurança e da prevenção de distúrbios na Esplanada, e não convidou o GSI. No fim daquele dia, telefonei para o diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), o senhor Saulo Moura da Cunha. Trocamos ideias genéricas sobre a segurança palaciana. Não falamos sobre nenhum esquema especial para o dia 8, pois não havia nenhuma informação que nos indicasse que ocorreria o que ocorreu. Deixei o palácio por volta das 20h”, relatou.

O ex-ministro-chefe do GSI frisou que não recebeu nenhum alerta de inteligência apontando ameaça de confronto. “A SSP-DF assegurava que tudo estava sob controle, que ações especiais eram desnecessárias. Aquele era o cenário no momento em que deixei o expediente no dia 6. As operações de plantão [no GSI] estavam montadas. Sábado, dia 7, passei o dia em casa com a família em Brasília. Não recebi alerta com escalada de anormalidade. Insisto, os alertas não chegavam a mim pelos canais oficiais estabelecidos”, afirmou G. Dias.

 

 

Sobre o dia dos ataques, o general disse à CPI que ainda na manhã do dia 8 entrou em contato com várias autoridades de segurança.“No meio do fim da manhã, troquei informações por telefone com a coronel Cíntia Queiroz, da PMDF. Ela me disse que estava tudo calmo. Também entrei em contato com o diretor da Abin, Saulo Moura, e ele me expressou certa preocupação. Por volta das 14h, inquieto e preocupado, decidi ligar para o general Carlos José de Assunção Penteado, que era meu secretário-executivo no GSI e que também havia ocupado o mesmo cargo na gestão do meu antecessor, o Augusto Heleno. O general Penteado me disse que estava tudo tranquilo e que eu não precisava ir até o Palácio do Planalto. Porém, permaneci inquieto e decidir ir”, disse. 

O general G. Dias contou aos parlamentares que se surpreendeu quando chegou ao Palácio do Planalto e percebeu a ausência de policiais militares bloqueando o acesso à sede do governo federal. “Quando cheguei ao Planalto, o general Penteado veio ao meu encontro. Perguntei onde estava o bloqueio da PMDF na frente do Palácio do Planalto. Era o bloqueio do plano de operações Escudo do Planalto, e tinha que estar montado. Cobrei com um palavrão o motivo de o bloqueio do Plano Escudo não ter sido feito. O general Penteado não deu resposta e saiu para fazer o bloqueio de proteção conforme eu ordenei”, afirmou.

A execução do esquema de segurança previsto no PAI foi criticada pelo general G. Dias. “Na reunião do dia 6 de janeiro, para a qual o GSI não foi convidado, estabeleceu-se o PAI. Ele determinava que deveria haver bloqueio e revista na altura do buraco do tatu, onde fica a Rodoviária do Plano Piloto. Deveria existir depois dali um bloqueio total que impedisse o acesso à alameda das bandeiras e à Praça dos Três Poderes. Não existiu, ou foi tênue ou inexpressivo”, observou.

 

O general também explicou sua atuação dentro do Palácio do Planalto quando golpistas invadiram o edifício. “Concentrei-me na minha missão, que era impedir que o núcleo central do poder palaciano fosse devassado, principalmente o gabinete presidencial no terceiro andar. Eu estava desarmado e à paisana, saí de casa sem jamais imaginar que iria encontrar aquela situação. Concentrei-me em retirar os vândalos do Palácio o mais rápido possível, de preferência, claro, sem baixas e sem confrontos sangrentos. Era preciso alcançar o quarto andar, o último, e descer evacuando os manifestantes de cima para baixo. Isso foi feito”, garantiu o militar.

G. Dias também contou que encontrou golpistas escondidos na sala da reunião da presidência, no terceiro andar. “Conduzi todos eles e mais alguns para o local de acesso à escada que os levaria para o segundo andar. Eu havia determinado que as prisões fossem feitas no segundo andar. Cuidei pessoalmente de manter indevassado o gabinete do presidente da república. Preservamos todo o quarto andar. As salas do gabinete pessoal, as salas do presidente. Bloqueamos os acessos ao anexo. Tudo sem derramar uma gota de sangue. No palácio foram presos 182 invasores que estavam nos corredores a partir de minhas determinações”, afirmou.

Água aos invasores

O general negou veementemente ter oferecido água aos invasores. “Não servi água para ninguém. A imagem é de outro major [José Eduardo Natali] e foi gravada às 15h59, enquanto a minha imagem foi gravada às 16h30. Eu não estava junto dele, não servi água e nem fui conivente”, disse. G. Dias também explicou porque não teria prendido os invasores que aparecem nas imagens das câmeras de segurança do palácio. “Estávamos com efetivo reduzido em um prédio de 36 mil metros quadrados. A ordem era para prender no segundo andar, preservando os seres humanos. E isso foi feito”, disse.

Relatório da Abin

Questionado pelo presidente da CPI, deputado Chico Vigilante (PT) a respeito da adulteração de dois relatórios produzidos pela Abin que citavam seu nome como destinatário de mensagens de alerta antes do dia 8 de janeiro, e que foram entregues ao Congresso Nacional, ao Ministério Público Federal e ao Ministério Público Militar, o general G. Dias negou qualquer fraude nos documentos. “Não adulterei nem fraudei nenhum documento. Os dois documentos são iguais, só diferem na informação a respeito da difusão. Colocaram o GSI no documento [como destinatário das mensagens de alerta], mas eu nunca participei de grupo de Whatsapp”, disse.

Transição

Ao explicar os preparativos do GSI para resguardar o Palácio do Planalto no fim de semana do dia 8 de janeiro, o general G Dias disse que o responsável pelo plano Escudo do Planalto teria avaliado que não havia risco. “A análise de risco feita pelo coronel Amorim era de baixa intensidade. As informações vinham de redes abertas e da inteligência da PM, que estabelece a agenda de manifestações”, disse. Ao ser questionado pelo deputado Chico Vigilante, sobre como transcorreu a transição no GSI com a mudança de governo, o general disse que não houve diálogo com a gestão anterior. “Não houve transição por causa da animosidade de um governo com o outro. Não tive contato com o general Heleno. Não houve transição nenhuma, nem mesmo sobre o que estava acontecendo em frente ao QG. Eu praticamente assumi a equipe antiga”, explicou.