Dias Toffoli repete à exaustão os mantras de sua gestão: autocontenção, diálogo e negociação. No seu plano de voo, tem como pontos cardeais duas presidências recentes do Supremo – dos ministros Nelson Jobim e Gilmar Mendes. Ambos tocaram o tribunal como se o Supremo Tribunal Federal (STF) estivesse a reboque da governabilidade, ambos foram deferentes à política e ao Executivo, negociando à luz do dia propostas e projetos que consideravam de interesse do país.

Toffoli se vê da mesma forma: disse que o Judiciário não é motor da sociedade, antecipou que baixará o tom da pauta do Supremo, negociou politicamente com o presidente Michel Temer (MDB) o aumento do salário da magistratura em troca do fim do auxílio-moradia e revelou que pretende conversar periodicamente com os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado. Mas há uma diferença para a qual é preciso se atentar.

No passado, Jobim e Mendes comandavam um tribunal ainda pouco observado externamente. A discrição da Corte permitia que os dois transitassem tranquilamente pela política sem a desconfiança e cobrança públicas. Hoje, a sociedade escrutina o STF. O tribunal está nas páginas dos jornais diariamente.

Os ministros são reconhecidos na rua e cobrados por suas posições. Por isso, Toffoli enfrentará uma dúvida: esta sociedade compreenderá a ostensiva atuação do presidente do STF junto à política? Ou enxergará essas reuniões públicas como conchavo e falta de independência? É possível ser Jobim no STF de hoje? E qual é o preço a pagar?

Gilmar Mendes, por exemplo, mantém uma agenda política intensa. Não nega. Durante a crise da JBS no governo Michel Temer, foi à casa do presidente em reuniões fora da agenda. Os questionamentos – no STF e fora dele – sobre suas relações e, portanto, sobre a legitimidade de algumas de suas decisões se multiplicam, mas não produzem qualquer efeito prático: Mendes não muda sua postura e nem se vê forçado a isso. E cria para si uma régua própria de comportamento.

Toffoli parece caminhar nesta mesma direção. Assim como Gilmar Mendes, ele também visitou Temer fora da agenda no Palácio da Alvorada em meio à crise política (novembro de 2017) para “um bate-papo”. Há algumas semanas, voltou a reunir-se com o presidente da República para negociar o aumento salarial dos juízes em troca do fim do auxílio-moradia. Ou seja, o governo concorda com o reajuste e o STF põe fim a um benefício contestado em ações judiciais no próprio Supremo.

No outro ponto da Praça, o ministro avisou que manterá, durante seu mandato, reuniões periódicas com os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE). Não quer conversar apenas quando uma crise se instalar por uma decisão atravessada do STF, por exemplo. Vale lembrar que ambos – Eunício Oliveira e Rodrigo Maia – são investigados no STF.

Toffoli já paga um preço por seu passado na política. Trabalhou na liderança do PT na Câmara dos Deputados, na Casa Civil e foi advogado-geral da União no governo Lula. Suas relações com o PT, mesmo que hoje distantes, serão sempre lembradas cirurgicamente.

Por exemplo, quando comandou, em junho, o movimento para soltar José Dirceu, condenado a mais de 30 anos de prisão na Lava Jato. Ou quando pautar, no início do próximo ano, as ações que levarão o STF a rever sua jurisprudência sobre execução provisória da pena. Será o voto de desempate de Toffoli que confirmará a mudança e a consequente libertação de Lula.

Há nove anos no STF, Toffoli revelou-se um bom ouvinte. Nunca protagonizou um bate-boca em plenário nem costuma retrucar os votos divergentes do seu. Como habitualmente diz, cada ministro do STF está cumprindo seu papel, levando adiante sua agenda e expondo suas posições. Não cabe a ele ou a qualquer outro ser censor de colega.

Na presidência, adiantou que acolherá sugestões de Luís Roberto Barroso para enfrentar o gargalo da repercussão geral no STF. Promete ouvir mais os colegas para definir quais processos serão julgados do plenário, compartilhando – até certo ponto – seu poder de pauta. E a meses de ser eleito presidente, já se articulava juntos aos colegas, marcando jantares na sua casa para estreitar pontes.

Afora as características pessoais, disse o próprio ministro, ele contará com a sorte: assume a presidência às vésperas das eleições que podem ser uma virada de página da crise política que perdura há cinco anos no país. No seu primeiro ano de mandato, as atenções estarão voltadas para o Executivo e Legislativo.

O STF, como ele mesmo quer, será naturalmente um coadjuvante.
Toffoli, portanto, pode ser um negociador. Deve falar em nome do STF, e não em seu nome. Deve articular saídas para crises internas. Deve ser a ponte com os outros poderes. Mas, a depender de como se movimentará, inadvertidamente poderá aprofundar as desconfianças públicas em relação à Corte.

Fonte: JotaInfo