A CRESCENTE INSATISFAÇÃO de uma parcela significativa da população, que saiu às ruas para protestar, reflete um claro desejo de mudanças na forma de gestão do Estado. O atendimento dessas demandas implica a reavaliação de práticas e valores que estão arraigados em nossa sociedade.

As distorções e desajustes na gestão do Estado brasileiro, traduzidas em serviços públicos de baixa qualidade, incompetência na ges tão pública e uma corrupção endêmica, foram agravadas pelos efeitos da crise econômica mundial, e pelos baixos níveis de crescimento econômico do país nos últimos anos.

Esse contexto indesejável foi construído a partir dos erros sistemáticos do governo federal, com a execução de política econômica in consistente, baixo nível de poupança e de investimento, intervenção na economia, criação de “contabilidade criativa”, invenção de “megaempresários”, entre outros.

O combate à corrupção se concretiza com a estruturação de órgãos e instituições estatais inde pendentes, com recursos humanos preparados e bem remunerados. É necessário haver uma cultura social que apoie esse esforço, sem distinções, visto que não é possível existir um Estado honesto sem uma sociedade íntegra. Assim, o combate à corrupção somente terá sucesso se houver mudança da estrutura estatal para enfrentar o problema e uma mudança da cultura social.

A opção política do governo, na busca de contar com uma base aliada confortável no parlamento, entregando ministérios e empresas públicas para partidos políticos aliados de “porteira fechada”, abriu os caminhos para a ineficiência e a corrupção, em larga escala, na administração pública. A escolha dos gestores públicos para os cargos estratégicos, com base apenas em critérios políticos, relegando a um segundo plano a competência e o compromisso com a administração pública, revelou-se uma forma teme rária de governar. A soma de todas essas variáveis explica o baixo nível de desempenho nas áreas de educação, saúde, segurança e transporte público.

Diante desse cenário, no qual está evidenciado um crescente enfraquecimento das instituições, agravado pela prática continuada de decisões e ações políticas e governamentais que conflitam com os interesses da sociedade, o Estado brasileiro está a caminho de uma crise de governança. Os embates decorrentes dessa crise irão se intensificar no próximo ano, quando o Brasil vai sediar a Copa do Mundo de futebol e vivenciar um ano eleitoral, no qual todas as demandas da sociedade e os conflitos políticos estarão entrando em ebulição.
FONTE: José Matias-Pereira é professor de administração pública e pesquisador associado do Programa de Pós-Graduação em Contabilidade da Universidade de Brasília. Economista e advogado, doutor em Ciência Política pela Universidade Complutense e de Madri e pós-doutor em Administração pela Universidade de São Paulo.