Estudar para concursos públicos exige foco, disciplina e constância. Mas, para muitas mulheres, essa equação envolve mais do que dedicação aos livros. São mães, esposas e trabalhadoras que precisam dividir o tempo entre tarefas domésticas, responsabilidades profissionais e a preparação para provas altamente competitivas. Uma pesquisa apresentada no 29º Congresso Internacional de Educação a Distância (2024) apontou que mulheres que conciliam trabalho, família e estudos, enfrentam uma sobrecarga significativa: dessas, 126 participantes relataram dificuldades constantes para manter o equilíbrio entre os três papéis.
Essa realidade tem impactos profundos na rotina de quem se prepara para concursos públicos. Para Karine Waldrich, auditora-fiscal da Receita Federal e especialista em métodos de estudo com base em neuroeducação e alta performance, o contexto precisa ser discutido com mais clareza. “A jornada da mulher concurseira é quase sempre invisível. Não é só sobre estudar, é sobre estudar enquanto o mundo ao redor exige dela o tempo inteiro”, afirma.
Além da tripla jornada, o tempo de estudo disponível para essas mulheres costuma ser escasso. Um levantamento aponta que grande parte das mães concurseiras estuda entre 1 a 2 horas por dia, geralmente à noite, quando o restante da casa já está dormindo. Ainda assim, enfrentam críticas, dúvidas sobre sua capacidade e cobranças sociais intensas. “Existe uma idealização em torno da aprovação. Mas pouca gente fala sobre o que essas mulheres precisam abdicar para manter uma rotina mínima de preparação”, observa Karine.
Ela destaca que, nesse cenário, não basta falar apenas de técnicas de memorização ou produtividade. É preciso compreender a complexidade emocional envolvida. “Quando falamos em desempenho, precisamos considerar o impacto da sobrecarga mental. É impossível manter o foco pleno quando o corpo está esgotado e a mente está dividida entre tarefas.”
Karine defende que o debate sobre concursos públicos precisa incluir um olhar interseccional e realista. “Não dá para falar de igualdade de oportunidades se ignorarmos que algumas pessoas têm mais tempo, mais apoio, mais dinheiro. Outras estão estudando enquanto fazem janta, ajudam o filho com lição e cuidam da casa. E, na maioria dos casos, essas pessoas são mulheres.”
Ela acredita que é hora de mudar a narrativa sobre o que significa “dar conta” dos estudos. Em vez de impor metas padronizadas, o foco deve estar na construção de rotinas possíveis, respeitando os limites de quem estuda. “Constância não é perfeição. É presença. Mesmo que seja por 30 minutos ao dia, com foco e intenção.”
Por fim, Karine reforça que concursos públicos devem ser vistos não apenas como uma prova de conhecimento, mas como um processo profundamente humano. “É um projeto de vida. E quando essa vida já é atravessada por tantas demandas, o esforço para chegar lá é ainda maior. Precisamos valorizar essa força silenciosa.” conclui.