Além do rombo que a construção do Estádio Nacional Mané Garrincha causou nos caixas da Terracap, como   mostrou o Jornal de Brasília com exclusividade na edição de quinta-feira, os gastos da empresa em patrocínios de festas e eventos já chegaram a quase R$ 53 milhões apenas nos primeiros sete meses deste ano. Um montante que chama a atenção, considerando-se que até o final de 2012, o total foi de R$ 3,1 milhões. Como garantia para cobrir   dívidas, imóveis públicos, avaliados em R$ 17,7 milhões, foram empenhados. Em março de 2013, a estatal tinha apenas R$ 45 milhões de disponibilidade frente a um passivo de R$ 929 milhões.

Os altos custos dos patrocínios chegaram ao JBr por meio de denúncias. Documentos mostram que pelo menos 17 eventos, entre shows, competições e projetos culturais, foram patrocinados pela Terracap. São   20 credores, aos quais deve-se devolver cerca de R$ 101,3 milhões. Todos os valores estão na denúncia do Conselho Fiscal da empresa, que exonerou 12 servidores que participaram de manifestações contra indícios de fraudes.

Sem relação

Os eventos patrocinados não têm qualquer ligação com a atividade da Terracap. A começar pelo  F1 H2O Grande Prêmio Brasília, de fórmula náutica. Nada menos que R$ 2 milhões foram destinados ao evento, que não incluía competidores do DF. Para a semana de moda Capital Fashion Week,  foram R$ 100 mil; para o Porão do Rock, R$ 230 mil; e para o Clube do Choro, R$ 487 mil. Neste ano, o evento World Bike recebeu ainda R$ 500 mil (veja os documentos de outros eventos na página ao lado).

Outro dado suspeito, que coloca em xeque as ações e investimentos, é a diferença de faturamentos de venda de imóveis entre um ano e outro. Só em março de 2013, a empresa lucrou R$ 472 milhões, enquanto que no mesmo período de 2012, a receita chegou a apenas R$ 42 milhões. Em contrapartida, as despesas operacionais de março chegaram a R$ 76 milhões, enquanto no mesmo mês do ano passado o valor acumulado foi de R$ 84 milhões. Para os conselheiros, “essa redução nas despesas ocorreu em função do baixo volume de doação de terrenos e obras em loteamentos deste ano”.

“Com todas essas denúncias, se comprovadas, é provável que a Terracap seja extinta se não voltar aos trilhos. O papel da empresa não é financiar eventos, quaisquer que sejam. Ela deveria preocupar-se com melhorias na qualidade de vida do cidadão. Ou seja, todo esse patrimônio que está sendo dado como garantia à empresas, deveria, na verdade, ser revertido para que ela cumpra o papel social dela”, avalia o docente da UnB, especialista em Administração Pública, José Matias-Pereira.

Informações serão investigadas

Os certames dentro da estatal também podem estar sob a mira de outras denúncias. Os próprios servidores da empresa alegam incoerências nas licitações. “A Terracap tem sido usada como fonte de caixa para desvio de dinheiro”, diz uma servidora do local.

Como exemplo, os funcionários explicaram como funciona: em uma primeira licitação, o empreendimento é oferecido por um valor avaliado como o de mercado. Mas depois, o imóvel é retirado do processo por motivos de incongruência, segundo os servidores. Após meses, o mesmo imóvel aparece em outra licitação. No entanto, o preço é até 50% mais barato. “A diferença certamente beneficia alguém”, aponta a servidora.

O MPDFT acolheu as denúncias no início deste mês. Além disso, informou que já existiam três representações em curso envolvendo os questionamentos dos servidores, um deles assinado por parlamentares com o Sindicato dos Arquitetos do DF. “Já solicitamos à Terracap as informações relativas às denúncias e iremos investigar todas”, disse o promotor de Justiça Roberto Carlos Silva.

Sobre o andamento dos processos no MPDFT, contudo, até o fechamento desta edição o órgão não deu retorno à reportagem do JBr.

População desaprova gastos

O gasto de dinheiro público com shows, festas e competições divide a opinião da população do DF. Entretanto, a verba de R$ 53 mil investida para a realização dos eventos é considerada um abuso.

Para o publicitário Bruno Borges, 23 anos, o gasto do governo com confraternizações é desnecessário e configura uma aplicação errônea de um alto recurso. “Isso é apenas um exemplo de que o governo foca em investimentos errados. O que a população precisa é de melhorias em saúde, infraestrutura em hospitais e destaque em educação. O gasto com festas e shows só reforça o interesse do governo em se autopromover”, ressalta.

Outras prioridades

A professora aposentada Mariângela Ferreira, 56 anos, também configura o alto gasto como desnecessário e abusivo. Para ela, a verba foi aplicada sem consciência e planejamento. “O povo merece diversão, mas o investimento em educação, saúde e transporte público é prioridade. O governo precisa ter a consciência em aplicar recursos em coisas limpas e claras”, aponta.

Já Reginaldo de Oliveira, 38 anos, aponta que levar cultura para o povo de baixa renda é necessário. No entanto, segundo o porteiro, a atitude deve ser feita de forma estruturada. Apesar de ser a favor de eventos, Reginaldo alerta que o gasto de R$ 53 mil com festas e competições é exagero. “O governo pode mostrar lazer, mas a educação, saúde e saneamento não podem ficar de fora. Tudo pode ser dividido de acordo com cada prioridade”, alerta

Fonte: Da redação do clicabrasilia.com.br