Os empregadores não poderão deduzir do Imposto de Renda (IR) as contribuições de INSS do salário dos empregados domésticos neste ano. Um projeto de lei para prorrogar esse benefício – criado pela legislação em caráter temporário – chegou a ser proposto, mas não foi votado a tempo pelo Congresso no ano passado. O receio é que o fim da medida aumente a informalidade e o desemprego entre a categoria.

A dedução foi aprovada pela primeira vez em 2006, em forma de Medida Provisória (MP) posteriormente convertida em lei, para incentivar a formalização dos empregados domésticos. O benefício foi prorrogado diversas vezes, até o ano passado. Uma nova extensão foi proposta no Projeto de Lei 1.766/ 2019, do senador Reguffe (Podemos), que previa a continuidade da dedução até 2024. O texto foi aprovado no Senado e encaminhado à Câmara dos Deputados, mas não foi agendado para votação antes do recesso parlamentar, que começou no dia 20 de dezembro. Por isso, a dedução não será mais aplicada em 2020.

No ano passado, o limite de abatimento da contribuição patronal sobre a Previdência Social na declaração do IR, ano-base 2018, foi de R$ 1.200,32. A Receita permitia deduzir os gastos de apenas um funcionário doméstico por declaração, e os salários dos trabalhadores não eram dedutíveis.

Para o presidente do Instituto Doméstica Legal, Mário Avelino, o fim da dedução vai incentivar demissões. “Hoje, para cada quatro domésticas, apenas uma tem carteira assinada. E, com essa medida, podemos aumentar a informalidade, demitindo pessoas que recentemente tiveram a carteira assinada e extinguindo o estímulo para que outros empregadores assinem a carteira. Vamos perder um grande incentivo para mostrar ao empregador formal que assinar carteira não é tão caro”, afirma. A entidade também chegou a pedir ao presidente Jair Bolsonaro a publicação de uma nova MP com a ampliação do benefício, mas não obteve resposta.

Segundo Avelino, 93% da mão de obra doméstica é feminina, e 70% são mulheres negras e pardas. “Muitas adquiriram recentemente direitos trabalhistas, como FGTS, seguro-desemprego e hora extra, aos quais só tem direito quem tem carteira assinada”, completa.

Dados do Sistema de Escrituração Digital das Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas (eSocial) mostram que, atualmente, existem 1,465 milhão de empregadores domésticos cadastrados no país. Metade se beneficiava com a dedução, conforme o Instituto Doméstica Legal. “O poder executivo só olha para as empresas e esquece que o empregado doméstica com carteira assinada é mais um trabalhador formal. O emprego doméstico ainda é olhado com desprezo, o empregador doméstico também é gerador de trabalho e renda como as empresas”, conclui Avelino.

Sem detalhes. Procurada pela reportagem, a Receita Federal informou apenas que o programa de Imposto de Renda Pessoa Física 2020 ainda não foi lançado e não há informações sobre as novas regras da declaração.

Formalização é a menor desde 2013

O índice de trabalhadores domésticos com carteira assinada é o menor no país desde 2013, quando foi publicada a PEC das Domésticas. Naquele ano, a formalização ultrapassou, pela primeira vez, o patamar de 30%. Após anos de aumentos consecutivos, em 2017 o número caiu e, em 2018, a proporção de domésticos com carteira assinada chegou a 28,6%, segundo estudo divulgado em dezembro pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). No terceiro trimestre do ano passado, esse índice saiu ainda mais: eram 6,2 milhões de domésticos, sendo 27,7% (1,7 milhão) com carteira assinada, conforme o IBGE.

Segundo o estudo, a crise fez com que muitas famílias dispensassem o serviço ou contratassem diaristas em vez de uma profissional com carteira assinada – em 2018, as diaristas já respondiam por 44% da categoria, o equivalente a 2,5 milhões de mulheres.

A pesquisa conclui que o trabalho doméstico ainda possui baixos rendimentos, discriminação e até assédio. Além disso, chama a atenção para a redução do número de trabalhadoras domésticas jovens, com até 29 anos: de 46,9% em 1995 para 13% em 2018. O porcentual de adultas entre 30 e 59 anos passou de 50% para quase 80% no período, e o de idosas cresceu de 3% para 7%.

Saiba mais

Isenção. No final de 2019, o presidente Jair Bolsonaro defendeu o aumento da faixa de isenção para pagamento de Imposto de Renda de R$ 1.903,98 para, pelo menos, R$ 3.000 neste ano. Ele disse que os contribuintes dessa faixa acabam recuperando o valor na restituição por meio das deduções e que a medida evitaria uma “mão de obra enorme para a Receita”, no entanto, ainda não há definição sobre o valor.

Malha fina. A Receita Federal recebeu 32,9 milhões de declarações em 2019. Cerca de 700 mil contribuintes caíram na malha fina do Imposto de Renda. Os principais motivos para a retenção, segundo o Fisco, foram omissão de rendimentos do titular ou seus dependentes e inconsistência na dedução de despesas médicas.