Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2020, mais de 2,3 milhões de mulheres foram diagnosticadas com câncer de mama, sendo a doença responsável pela morte de aproximadamente 685 mil pacientes. A boa notícia é que o avanço alcançado nos tratamentos vem dando cada vez mais sobrevida às pessoas que padecem da doença.

A médica intervencionista em dor e autora do livro “Existe vida além da dor”, dra. Amelie Falconi, pondera que este novo cenário surge repleto de desafios: um dos mais importantes é saber lidar com as dores persistentes que decorrem do câncer e do tratamento do câncer de mama, seja a cirurgia  – cirurgia de retirada total ou parcial da mama – seja  radioterapia e/ou quimioterapia.

“Para se ter uma ideia da dimensão do problema, a dor persistente após o tratamento do câncer de mama afeta de 25% a 60% das pacientes, sendo que a dor persistente pós-mastectomia é sentida por cerca de 40% dos pacientes com a doença”, diz a médica. Segundo ela, a dor após a cirurgia costuma ser causada por danos ou tecidos cicatriciais, mas avisa: as dores não decorrem apenas disso. “Após uma mastectomia, algumas possíveis complicações a longo prazo que podem ocasionar dor ou desconforto incluem: linfedema e restrição de movimento”, diz.

Resultado do acúmulo de líquido nos tecidos próximos aos gânglios linfáticos removidos  durante a mastectomia o linfedema pode resultar em inchaço, dor e sensação de peso no braço afetado. Por sua vez, um dos desdobramentos do linfedema, explica a médica, é a restrição do movimento. “Por causar desconforto contínuo e dor no braço, a condição acaba gerando perda de flexibilidade e amplitude de movimento no ombro do lado em que ocorreu a remoção da mama”, diz  Já a restrição de movimento pode acarretar dores musculoesqueléticas. “Inclusive um estudo prospectivo, que se concentrou na prevalência de dor musculoesquelética, demonstrou que 20% das mulheres relataram dores nas articulações e rigidez muscular após a cirurgia primária de câncer”, declara.

Com relação as opções disponíveis para gerenciar o tratamento da dor decorrente da mastectomia, dra. Amelie destaca que a decisão sobre qual tratamento ou combinação de tratamentos utilizar depende de vários fatores, que giram em torno das características individuais do paciente. “O tratamento das dores acarretadas pelo linfedema por exemplo, geralmente, envolve fisioterapia especializada, drenagem linfática manual, uso de roupas de compressão, enfaixamento, bloqueios simpáticos e cuidados com a pele”, diz. Para outros tipos de dores, informa a médica, as opções variam entre analgésicos comuns e medicações especiais, opioides, reabilitação, exercícios físicos, psicoterapia e procedimentos intervencionistas.

Além da incapacitação física, a dor crônica gera uma série de transtornos emocionais naqueles que a experimentam, que, por sua vez, retroalimentam a dor.  Segundo dra. Amelie, estudos retrospectivos associaram mais facilmente a disposição psicológica à dor crónica, observando que a ansiedade, a depressão, os distúrbios do sono, a somatização, a catastrofização e o stress percebido foram todos significativamente relacionados à dor persistente pós-mastectomia, por exemplo.

Nesse sentido, enfatiza a médica, ganha elevada importância o suporte psicossocial e as redes de apoio para mulheres que enfrentam dores associadas ao câncer de mama e aos seus tratamentos. Conforme dra. Amelie, o suporte psicossocial desde o momento do diagnóstico gera excelentes benefícios aos pacientes com a doença. “Ele ajuda no enfrentamento do câncer de mama e do tratamento, na maior adesão ao tratamento e da dor acarretada e na prevenção dos fatores de risco, como sintomas de ansiedade, depressão e catastrofização”, afirma.

Amelie Falconi, médica intervencionista em dor

e autora do livro “Existe vida além da dor”

 

Mudança de hábitos

O câncer de mama e seu tratamento são debilitantes por diversas razões, não apenas pela dor que proporcionam. Dra. Amelie afirma que existem diversas sequelas que podem vir da doença, dentre as quais a perda de capacidade aeróbica. “Quase 1/3 das pacientes que sobrevivem ao câncer de mama sofrem deste problema, que não permite a independência, mesmo após a cura”, diz.

Contudo, ressalta a médica, esta sequela e muitas outras podem ser minimizadas por mudanças no estilo de vida, com a adoção de melhores hábitos, como a realização de exercícios físicos e uma dieta adequada em nutrientes. “A prática de atividade física causa, entre outros benefícios, a diminuição da fadiga e fraqueza muscular, incremento da função cardiovascular e capacidade funcional, melhora da composição corporal e mais qualidade de vida, além de diminuir as chances de recidivas”, comenta.

Um dieta com nutrientes adequados, por sua vez, em associação a atividade física, contribui para evitar que a paciente tenha perda de massa magra e para minimizar a redução do apetite, náuseas, vômitos, constipação e diarreia, que costumam ser causados por tratamentos adjuvantes, como quimioterapia e radioterapia. “Tumor, tipo de quimioterapia e radioterapia interferem no plano nutricional. Assim, todas as pacientes com câncer deveriam ter acompanhamento nutricional especializado, para orientações e intervenções”, finaliza.

 

 

Sobre a Dra. Amelie Falconi

  • Especialização em Medicina da Dor pela Santa Casa da Misericórdia de São Paulo
  • Título de Especialista em Dor pela AMB (Associação Médico Brasileira)
  • Fellow Of International Pain Practice (FIPP) pelo World Institute of Pain (WIP)
  • Fellowship de Intervenção em Dor – Clínica Aliviar / sinpain Rio de Janeiro.
  • Pós-graduação em Medicina Intervencionista da Dor Guiada Por Ultrassonografia – sinpain
  • Pós-graduação em Anestesia Regional – Instituto de Ensino e Pesquisa do Hospital Sírio Libanês
  • Especialização em Anestesiologia MEC / SBA
  • Medicina pela Universidade Federal de Juiz de Fora – UFJF
  • Ministra aulas na pós-graduação de medicina intervencionista da dor do Hospital Albert Einstein
  • Ministra aulas na pós-graduação de medicina intervencionista da dor na Faculdade sinpain