Uma antiga disputa entre sindicatos da saúde do Distrito Federal voltou ao centro das atenções nos últimos dias. Servidores da Secretaria de Saúde descobriram que uma decisão judicial proferida em 2024 teria ordenado a devolução, a alguns sindicatos da categoria, de milhões de reais descontados erroneamente em favor do SindSaúde, referentes a contribuições sindicais entre 2012 e 2017.
No centro da polêmica estão os deputados distritais Dayse Amarílio (PSB) e Jorge Vianna (PSD), que, à época dos descontos, presidiam, respectivamente, o SINDENFERMEIRO e o SINDATE. Na ocasião, ambos teriam prometido que os valores seriam devolvidos aos servidores. Agora, os ex-sindicalistas estão sendo cobrados pelas categorias.
Em um vídeo resgatado recentemente e amplamente compartilhado em grupos de WhatsApp, Jorge Vianna, então presidente do SINDATE, afirmou:
“O SINDATE foi o primeiro a falar. Quando esses valores chegarem nas mãos do sindicato da categoria, nós vamos falar assim: tá aqui o dinheiro, o dinheiro é seu, meu amigo, faça o que você quiser com esse dinheiro.”
Já Dayse Amarilio aparece em outra gravação, como presidente do SINDENFERMEIRO, negando interesse da entidade nos valores descontados:
“Na verdade, o sindicato dos enfermeiros nunca requereu e não tem interesse, como nós falamos diversas vezes, em diversas reuniões jurídicas, inclusive com a Procuradoria, que nós não tínhamos interesse.”
A promessa de devolução também foi reiterada, em vídeo, pelo dirigente Tarcísio Faria, que declarou:
“Se esse dinheiro vier para a conta do sindicato, nós vamos fazer uma assembleia e, nessa assembleia, vamos decidir o que fazer com esse dinheiro. Se a gente vai devolver para os sindicalizados, que é a nossa ideia, e para quem não é sindicalizado, a própria assembleia vai decidir o que fazer.”
A TV SindEnfermeiro chegou a divulgar conteúdo informando que os valores seriam devolvidos aos servidores.
Cobrança por transparência e revolta entre os servidores
Com a decisão sobre a liberação judicial dos recursos R$ 2 milhões para o SINDATE e mais de R$ 2 milhões para o SINDENFERMEIRO, além de valores para outros sindicatos, os servidores esperavam uma prestação de contas imediata. No entanto, até o momento, de acordo com as categorias, nenhuma das entidades se pronunciou oficialmente sobre o destino do dinheiro e se ele já foi recebido.
O clima nas redes sociais e nos grupos de WhatsApp da categoria é de frustração e desconfiança. Alguns servidores chegaram a cogitar desfiliação em massa como forma de protesto. Relatos indicam indignação com o silêncio dos dirigentes sindicais:
“Esse dinheiro foi um tiro no pé deles. Tentaram colocar o SindSaúde como ruim e no final ficaram com a grana e com a revolta dos servidores. Deviam ter se manifestado no dia em que receberam, mas preferiram ficar no off, esperando o povo descobrir”, escreveu uma servidora.
“A demora na manifestação dos dirigentes só comprova que tem algo errado”, disse uma servidora.
Entenda a origem da disputa
Em 2013 e 2014, o SindSaúde, presidido à época por Marli Rodrigues, conseguiu autorização judicial para descontar a contribuição sindical de todos os cerca de 62 mil servidores da Secretaria de Saúde do DF, independentemente da categoria. Isso gerou reação de outros sindicatos, que recorreram à Justiça pedindo a divisão proporcional dos valores, alegando representar legitimamente categorias específicas.
Após anos de disputa, o Tribunal de Justiça do DF homologou, em 2024, um acordo que repartiu os valores da seguinte forma:
• SINDMÉDICO/DF – R$ 5.830.805,80
• SINDATE/DF – R$ 2.022.632,92
• SINDENFERMEIRO/DF – R$ 2.064.121,27
• SINDIRETA, SINDIVACS, SINDSER, SODF, SINDBIOMÉDICOS, SINDAFIS – também receberam valores proporcionais menores.
Apesar da liberação, até agora nenhuma das entidades detalhou publicamente como utilizará os recursos ou se haverá devolução aos servidores que tiveram os valores descontados.
Situação do SindSaúde segue indefinida
O SindSaúde, sindicato que iniciou a cobrança, continua sem acesso à maior parte dos valores por conta de bloqueios judiciais, penhoras e disputas internas. O juiz da 2ª Vara da Fazenda Pública suspendeu a liberação ao sindicato até que todas as pendências sejam resolvidas.
