Em todo o estado de São Paulo, a polícia conseguiu identificar 214 autores de feminicídios, ou seja, 96% do total de casos registrados no ano passado. Dos 221 crimes cometidos contra mulheres em 2023, 101 suspeitos foram presos em flagrante, e os demais foram indiciados durante as investigações – apenas sete casos ainda têm autoria desconhecida.
Segundo levantamento da Polícia Civil, do total de feminicídios registrados no ano passado, apenas em 63 casos as vítimas tinham registrado ocorrências anteriores contra os agressores.
“Nosso desejo é que esses crimes não ocorram. Mas, uma vez registrados, nosso dever é fornecer uma resposta rápida e eficaz à sociedade para identificar e colocar esses criminosos atrás das grades. No estado de São Paulo, agressores de mulheres não ficarão impunes”, afirmou o secretário da Segurança Pública, Guilherme Derrite. “Estamos investindo ainda mais em tecnologia e na ampliação das equipes especializadas para dar todo o suporte às vítimas desses covardes.”
Segundo a delegada Jamila Ferrari, coordenadora das Delegacias de Defesa da Mulher, os dados servem como um alerta para as autoridades. Em um contexto conjugal, a violência ocorre dentro de um ciclo que é constantemente repetido e sempre começa antes do crime. “Infelizmente, por algum motivo, essa mulher não sabia ou tinha medo, ou vergonha, ou achou que nada iria acontecer e não procurou a polícia”, observou.
Ainda segundo a delegada, esse contexto indica que é preciso continuar incentivando as mulheres a registrarem as ocorrências “ao menor e primeiro sinal de violência, mesmo que seja um xingamento ou ameaça”. Desse modo, a polícia poderá agir, seja com um pedido de medida protetiva ou mesmo a prisão do agressor.
Segundo a Polícia Civil, 11,1 mil estupros de vulnerável e 3,3 mil estupros foram registrados em todo o estado em 2023, um aumento de 9,8% em relação a 2022. “A subnotificação nesses casos ainda é alta”, alertou a coordenada das DDMs. “São os crimes mais subnotificados que temos.” O aumento das denúncias impacta no crescimento no número de casos, e é essencial que a vítima procure os agentes de segurança.
O medo e a vergonha são os principais motivos que desestimulam a vítima a buscar apoio e denunciar o agressor. “Além de machucar fisicamente, também traz uma violência psicológica muito grande, fazendo com que a mulher não procure ajuda”, explicou Jamila. Para a delegada, o aumento das notificações indica que as vítimas estão sentindo confiança para buscar socorro.
Proteção integrada
A 1ª Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), na região do Cambuci, esclareceu 93% dos casos de feminicídios ocorridos desde 2020 na área central da cidade de São Paulo. Foram 16 registros no período, com 15 casos solucionados e 14 suspeitos presos. Em um dos casos, o acusado conseguiu fugir do país, mas foi possível identificá-lo e solicitar a prisão.
O trabalho investigativo é determinante para a resolução dos casos. “Toda investigação é voltada para o relacionamento daquela vítima com o possível agressor ou quem era aquela pessoa que ela se relacionava. Nós vamos atrás desse suspeito para colher o maior número de evidências possíveis, com todos os métodos de apuração que a Polícia Civil põe à disposição”, explica a delegada Cristine Nascimento Guedes Costa.
Para a titular da 1ª DDM, o principal trabalho da equipe nesses casos é provar que o parceiro foi o autor do crime. “Temos que vincular o suspeito à ocorrência para que a Justiça aceite o pedido de prisão, então, o trabalho precisa ser robusto”, frisou Cristine. “Todas as nossas investigações tiveram as prisões convertidas em preventivas, tanto em flagrante quanto temporárias, e isso já mostra um êxito da investigação por manter o autor preso.”
A 1ª DDM funciona dentro da Casa da Mulher Brasileira, na região central da capital. A unidade reúne todos os serviços de acolhimento e escuta qualificada e é responsável por uma região que compreende uma população de quase 800 mil pessoas.
“A gente consegue suprir a demanda, dar um retorno positivo para a mulher dentro da nossa estrutura. É um atendimento que funciona 24 horas para dar o suporte a essa vítima de violência.”
As vítimas de violência que procuram a Casa da Mulher são atendidas por uma equipe multidisciplinar. Além da 1ª DDM, o local conta com um juizado especializado em violência doméstica e familiar, Defensoria Pública, Ministério Público e uma equipe da Guarda Civil Metropolitana para suporte ao cumprimento de medidas judiciais.
“O grande diferencial é dar à mulher atendimento integral, completo dentro da própria estrutura”, explicou a delegada. “Aqui dentro ela tem todas as demandas atendidas, inclusive com deferimento de medida protetiva. Isso evita que a mulher desista de seguir adiante com a denúncia, pois tem no seu entorno toda proteção e assistência necessária”, reforçou.
A região central de São Paulo fechou o ano passado com 189 queixas de estupro, número praticamente estável em relação a 2022, quando 188 casos foram denunciados. A delegada explicou que a mulher sempre foi vítima de violência doméstica e crimes sexuais e, por isso, ainda há subnotificação de ocorrências.
“A realidade que temos hoje é que a mulher tem esse empoderamento, ou seja, ela acredita que ela é vítima da situação, que ela não se colocou naquela situação para passar pela violência sofrida. Quando a mulher acredita que é vítima e vai ter respaldo do poder público, ela vem e denuncia.”
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