Um dos grandes obstáculos do diagnóstico de zika é que os atuais testes do mercado ainda apresentam risco de reação cruzada com o vírus da dengue, dificultando a diferenciação das infecções. Isso porque a principal proteína presente nestes vírus, a NS1, é muito semelhante entre os dois.
Um estudo conduzido pelo Instituto Butantan, Instituto Adolfo Lutz, Universidade de São Paulo (USP) e Universidade Estadual Paulista (Unesp/SJRP) identificou dois peptídeos (fragmentos) da NS1 que detectam a presença de anticorpos específicos contra zika. Assim, podem ser usados para desenvolver novos testes mais precisos. O trabalho foi publicado na revista Viruses em fevereiro deste ano.
Entre 2015 e 2016, o Brasil enfrentou um dos maiores surtos de zika, com um aumento expressivo no número de recém-nascidos diagnosticados com microcefalia (malformação do cérebro), principal consequência da infecção em gestantes. Segundo o Ministério da Saúde, foram quase 2 mil casos confirmados de bebês com síndrome congênita associada à infecção pelo vírus zika (SCZ). Antes da epidemia, a média de casos era 9 por ano.
O primeiro passo do estudo, feito no Laboratório de Bacteriologia do Instituto Butantan, foi gerar anticorpos a partir da imunização de modelos animais com a proteína NS1 de zika, produzida em laboratório pelo Instituto de Ciências Biomédicas da USP.
“Após obtermos anticorpos monoclonais e policlonais específicos, fizemos testes para descobrir que partes da proteína NS1 eles reconheciam que eram de zika e que não cruzavam com dengue”, explica a pesquisadora Roxane Piazza.
A partir das sequências identificadas, foram desenvolvidos peptídeos sintéticos de NS1 em colaboração com o pesquisador Carlos Prudêncio, do Adolfo Lutz. Ao testar as moléculas com amostras de soro de pacientes, os cientistas encontraram dois peptídeos capazes de detectar, de forma precisa, anticorpos antizika. Com isso, seria possível desenvolver testes para identificar anticorpos IgG e IgM e saber se a pessoa já esteve ou está infectada pelo vírus.
Outra abordagem, segundo Roxane, é fazer o caminho oposto: usar os anticorpos específicos de zika para detectar a presença do antígeno (proteína NS1) no sangue dos pacientes. “A NS1 é a proteína mais secretada pelo vírus durante a infecção e, portanto, é o principal alvo diagnóstico”, aponta.
Os cientistas ressaltam que é questão de tempo até uma nova epidemia de zika acontecer e o desenvolvimento de testes mais precisos é de extrema importância para o monitoramento da doença, especialmente para acompanhar as gestantes e prevenir a microcefalia. “Nosso objetivo é desenvolver técnicas e ferramentas para quando o zika voltar. Assim, estaremos muito mais preparados do que estávamos em 2015”, afirma Carlos.
Um estudo recente publicado na revista The New England Journal of Medicine mostrou que a taxa de mortalidade em crianças de até 3 anos nascidas com SCZ é 11,3 vezes maior do que naquelas nascidas sem a condição. Outra pesquisa mostrou que, entre 2015 e 2018, mais de 80% das mortes em crianças com SCZ ocorreu antes de completarem um ano de idade.
Casos de zika aumentaram 42% em 2022
Em 2022, o Brasil registrou 9 mil casos prováveis de zika, sendo 591 em gestantes, segundo boletim epidemiológico do Ministério da Saúde. Em comparação a 2021, houve um aumento de 42% no número de casos da doença. Os estados que mais registraram casos prováveis em gestantes foram Rio Grande do Norte (210), Bahia (53), Paraíba (53), Alagoas (48) e Pernambuco (43), concentrando 68,9% dos casos do país.
O vírus da zika é transmitido pelo mosquito Aedes aegypti, assim como outras arboviroses como dengue e chikungunya. Os sintomas costumam aparecer de dois a sete dias após a picada e podem incluir febre baixa, erupções cutâneas, dor de cabeça, dor nas articulações, dor muscular e conjuntivite. De acordo com a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), é possível que apenas uma em cada quatro pessoas infectadas desenvolva sintomas.
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