Com apenas 28 mil habitantes e 864 km² de área territorial, a cidade de Casa Branca tem peso relevante na balança do agronegócio nacional. O município é o maior produtor brasileiro de laranja e o principal paulista no cultivo de batatinha (IBGE, 2021). Mas a sua marca mais relevante, mesmo, tem a ver com as relações umbilicais com a jabuticaba, “frutas em botão” na linguagem tupi.
Os laços de identidade entre Casa Branca e o fruto da jabuticabeira ganharam um novo capítulo a partir da Lei 15.093, de 22 de julho 2013. Por deliberação da Alesp – a partir de iniciativa do deputado Rodrigo Moraes (PL), filiado ao PSC na época –, a cidadezinha gigante do agronegócio brasileiro foi elevada à condição de Capital Estadual da Jabuticaba em São Paulo.
Nacionalmente, com base no último Censo Agropecuário do IBGE, o Estado de São Paulo perde apenas para Goiás em volume de produção da fruta. Casa Branca, sozinha, responde por metade do bom desempenho paulista.
A safra estadual da jabuticaba em 2022, informa a Secretaria de Agricultura e Abastecimento (SAA), foi da ordem de 3.247 toneladas. Os pomares casa-branquenses concentraram 49,52% dessa colheita.
Na esfera municipal, a relação identitária da jabuticabeira com Casa Branca fez com que a planta se tornasse em 2019 a árvore-símbolo do município com lei aprovada pelos vereadores. E um detalhe: um galho de jabuticabeira em floração compõe o brasão casa-branquense.
Cultura jabuticabeira em Casa Branca
Na esteira do título aprovado pelos deputados paulistas, o município de Casa Branca turbinou a economia fortalecendo ou incentivando atividades comerciais associadas à jabuticaba.
Segundo a gerente municipal de Turismo, Victoria Draganoff Fay, o turismo rural tem sido um dos segmentos econômicos mais favorecidos desde a homenagem oficial da Alesp.
Para explorar a jabuticaba turisticamente, relata Fay, a gestão municipal e a iniciativa privada adotam estratégias conjuntas como visitação a pomares e degustação da fruta no pé. A gestora também ressaltou eventos culturais como o Festival Gastronômico da Jabuticaba, cuja 7ª edição vai ocorrer de 6 a 17 de setembro deste ano – relatos dão conta da existência da festa desde 1920.
Na avaliação do agrônomo José Carlos Nogueira, o título de Capital Estadual da Jabuticaba aflorou memórias afetivas dos moradores da cidade. É comum encontrar a planta nos quintais de vários casarões antigos espalhados pela área urbana casa-branquense.
“Casa Branca já era a terra da jabuticaba há mais de 100 anos por ser o centro de origem dessa fruta. A oficialização contribuiu muito. O próprio casa-branquense começou a rever os seus conceitos de começar a valorizar aquilo que já tinha e não dava valor”.
Nogueira administra a Fazenda Quinta das Duas Barras, considerada o ninho da jabuticaba em Casa Branca pelo pioneirismo na produção e exploração comercial de mudas da frutífera.
E a produtora agrícola Priscilla Fagan, da Fazenda Boa Vista – onde fica o maior pomar de jabuticaba de Casa Branca –, salientou que a denominação oficial dada pela Alesp serviu para “trazer referência e incentivo a novos negócios derivados da fruta e ao turismo”, gerando emprego e renda para cidade.
Famílias visionárias
Além da mãozinha da própria natureza, dado que a árvore é nativa do Brasil, duas famílias em Casa Branca tiveram participação decisiva para que a terra da jabuticaba expandisse o cultivo da fruta.
“Não houve alguém que tenha plantado a primeira jabuticabeira em Casa Branca. Aqui já tinha a planta por toda a região, quase todas as residências da cidade tinham [a árvore] no quintal”, adiantou José Carlos Nogueira, da Quinta das Duas Barras. “Há 60 anos, meu pai [Diaulas Nogueira] começou a formar mudas e a comercializar jabuticabeiras. O plantel chegou a ter mais de 60 mil plantas pequenas para venda”, ressaltou.
Nogueira estima que o município tenha na atualidade mais de 40 mil jabuticabeiras, incluindo plantas jovens e as árvores em produção.
Após a expansão agrícola da jabuticabeira, o agrônomo enxerga outro filão comercial para a árvore-símbolo de Casa Branca. “Hoje, um grande mercado da jabuticabeira é o paisagismo. O cliente quer uma planta que já esteja produzindo. Vendemos para residências, condomínios e grandes centros urbanos”, comenta José Carlos Nogueira. São vendidas, em média, 100 jabuticabeiras. Os preços variam de R$ 1 mil a R$ 10 mil.
Já a Família Fagan destaca-se pela comercialização da fruta. De acordo com Priscilla Fagan, o cultivo de jabuticaba é rentável, porém exige investimentos a longo prazo. “O cultivo é feito com irrigação por aspersão em cada pé – fomos os pioneiros em importar [essa técnica] de Israel – e a análise de terra para ver a necessidade de nutrientes de cada pomar”, explicou Priscilla.
Mesmo com todo o investimento financeiro e tecnológico, ressalta a empresária, a produção da fruta é quando a árvore quer. “Podemos só estimular e monitorar. A produção varia por ano porque o clima influencia muito. São feitas até duas colheitas em cada pomar, no ano”.
Como o crescimento da jabuticabeira e as florações são lentas – a depender da variedade, a primeira safra pode demorar 8 anos para acontecer – a estratégia adotada para compensar a espera é o plantio alternado com outras culturas agrícolas, como laranja, milho, limão e café.
“O plantio em consórcio ajudou. Até uns 25 anos, o pé da jabuticaba é pequeno. Laranja com um ano já começa a produzir. É necessário diversificar, porque [do contrário] as contas não fecham”, pontuou a empresária, informando que 70% de toda área é só jabuticaba.
Ela destacou que a frutinha nativa da Mata Atlântica turbina o mercado de trabalho, especialmente durante a safra anual em setembro. “Na época da colheita, mais de mil pessoas são empregadas”, informou.
Novos passos
Uma conquista que deverá endossar ainda mais a cultura jabuticabeira de Casa Branca será o selo de Indicação Geográfica (IG) junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). O trabalho acadêmico para obtenção do registro é desenvolvido por pesquisadores do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP).
Com o selo IG, Casa Branca passará a ser reconhecida nacionalmente por características naturais exclusivas que diferenciam a jabuticaba casa-branquense da fruta produzida em outras regiões brasileiras.
E na Alesp, um projeto de lei do deputado estadual Altair Moraes (Republicanos) que classifica Casa Branca como Município de Interesse Turístico (MIT) também deverá favorecer a cultura jabuticabeira. A classificação assegura a destinação de recursos orçamentários para as cidades beneficiadas.
Entre os atrativos turísticos para justificar a classificação, foram citados o Festival da Jabuticaba e o fato de o município possuir um dos maiores pomares brasileiros da fruta. No momento, o PL 537/2020 aguarda parecer da Comissão de Turismo da Alesp.
Benefícios da Fruta
Pelo Brasil, estudos com a jabuticaba têm se debruçado sobre o valor nutricional da fruta cuja parte mais nutritiva costuma ser a casca.
Rica em vitaminas, minerais, fibras e compostos ativos (como polifenóis, niacina, ferro e antocianinas), a jabuticaba pode ser consumida in natura ou na forma processada em doces, bolos, sorvetes, compotas, geleias, licores e fermentados alcoólicos.
Trabalhos acadêmicos com o produto da jabuticabeira ressaltam os potenciais medicinais dos elementos químicos presentes na frutinha tipicamente brasileira.
A Universidade Federal de Viçosa (UFV), por exemplo, aponta uma bebida de jabuticaba que pode ajudar na recuperação física de atletas e atuar contra o depósito de gordura no fígado.
A Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) observou que as fibras presentes na casca da fruta aumentam a produção de glutationa, substância produzida no fígado que auxilia na proteção antioxidante.
Na Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP) foi avaliado o potencial da jabuticaba na prevenção da obesidade.
A Federal de Goiás (UFG) verificou que compostos encontrados na casca provocam um considerável relaxamento das artérias, esse efeito contribui para baixar a pressão.
Pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) detectaram atributos anti-inflamatórios da jabuticaba que podem contribuir, inclusive, no combate ao Alzheimer.
Outra frente de pesquisa da Unicamp avalia o uso do extrato da casca de jabuticaba no atraso da progressão do câncer de próstata.
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