Parte da Campanha Cultura Negra Vive, que comemora o mês da Consciência Negra, o Pontão de Cultura Ancestralidade Africana no Brasil lançou nesta terça-feira (12), na Fundação Cultural Palmares, em Brasília, a Campanha de Tradições de Matriz Africana Contra o Racismo com foco na valorização das tradições de matriz africana. A iniciativa busca chamar atenção para a importância desses espaços como pilares de identidade, autoestima e ancestralidade para o povo negro no Brasil, enfrentando crescentes ataques e preconceitos contra os territórios de culturas tradicionais.
De acordo com a Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos, em 2021 foram registradas 583 denúncias de intolerância religiosa, sendo a maioria delas feitas por praticantes de tradições de matriz africana. Em 2024, somente no primeiro semestre, esse número saltou para 1.940 denúncias, representando um aumento de 332% em quatro anos.
A Campanha de Tradições de Matriz Africana Contra o Racismo também convoca artistas, ativistas, coletivos, organizações, entidades e instituições públicas e privadas a se unirem na construção de um calendário unificado de ações que visam valorização dessas tradições.
Durante o evento, João Jorge Rodrigues, presidente da Fundação Cultural Palmares (FCP), destacou a urgência de preservar as heranças culturais do povo negro e da importância da FCP para a comunidade.
“Essa é uma Casa da Cultura Afro-Brasileira, que carrega algo muito simbólico para nós. A Fundação Cultural Palmares não é uma fundação religiosa, mas é uma fundação que representa uma espiritualidade ligada a um símbolo poderoso de justiça. Essa casa só terá sentido se for, de fato, um templo da nossa espiritualidade, um espaço para todos os povos africanos que vieram para cá, trazendo suas manifestações e religiões libertadoras. Em 524 anos de Brasil, nossa cultura tem ajudado, geração após geração, a compreender o conceito do divino. Agora, Brasília finalmente tem uma Casa da Luz, que é a nossa Casa da Cultura.”
Leandro Anton, coordenador de Articulação da Cultura Viva do Ministério da Cultura (MinC) lembrou o papel dos Pontões de Cultura para dar visibilidade e apoio às redes culturais no país. “Em uma democracia, o governo representa a sociedade civil, mas sabemos que desigualdades ainda distorcem essa representação. Por isso, temos o compromisso de zelar pelas conquistas e avançar na construção de uma política pública como o Cultura Viva, que reconhece os direitos culturais e sociais de redes de Pontos de Cultura, valorizando suas trajetórias. O Ponto de Cultura não é um projeto; ele é, na verdade, o reconhecimento e o fortalecimento dessas histórias de luta”, afirmou.
O coordenador de Articulação da Cultura Viva ainda complementou: “Essa é uma das principais responsabilidades que assumimos aqui. Trabalhamos com campanhas que respeitam as realidades e trajetórias de cada rede cultural, defendendo não só os direitos de cada grupo, mas também os direitos humanos e a cultura brasileira como um todo. Essa é uma entrega permanente, que traduz nosso compromisso com a ação cultural, artística e social.”
Segundo o Bábà Paulo Ifatide, coordenador-geral do Pontão de Cultura Ancestralidade Africana no Brasil, este é o primeiro edital que aborda a cultura negra em si.
“Foram 500 anos trabalhando para nos destruir, e aqui estamos, de pé, falando um idioma que eles rejeitam, cantando em outro idioma, com outra forma de viver, de vestir, de acreditar no mundo. Sempre optei por enfrentar essas questões pela cultura, mas sozinhos não temos o poder necessário para mudar tudo. Por isso, lançamos uma campanha nacional e estamos aqui com toda a comissão, agradecendo a presença de todos. Este é o primeiro edital com essa abordagem. Ele é feito para a cultura negra, não somente para pessoas negras”, explicou.
Silvany Euclênio, da equipe do Pontão de Cultura Ancestralidade Africana no Brasil, explicou os objetivos da campanha. “Essa campanha é colaborativa; queremos que todos e todas possam aderir e somar esforços. Nosso primeiro objetivo é valorizar as tradições de matriz africana como um instrumento fundamental no combate ao racismo. Queremos também denunciar o racismo e a violência sofridos pelos nossos espaços e povos de matriz africana, que são frequentemente agredidos, e mobilizar a sociedade para que se posicione. Por fim, buscamos fortalecer as lideranças tradicionais, instrumentalizando-as para entenderem e lidarem com o racismo e defenderem seus territórios e direitos. Essa é uma campanha permanente, pois o racismo é um problema contínuo, e nossa luta precisa ser igualmente duradoura”, concluiu.
Reunião
Nesta segunda-feira (11), o Comitê Gestor do Pontão e representantes do Ministério da Cultura se reuniram para discutir os próximos passos do projeto e reiterar o compromisso com a defesa das tradições afro-brasileiras. O encontro foi realizado na sede do Ministério e contou com a participação da secretária de Cidadania e Diversidade Cultural, Márcia Rollemberg, que reforçou a importância do fomento aos Pontões de Cultura na reativação da Política Nacional de Cultura Viva (PNCV), fortalecendo as redes de Pontos de Cultura territoriais e por temáticas.
“A rede de Pontões é uma parceria da maior importância e todos os resultados têm sido muito potentes, desde os cursos para pareceristas, as campanhas, as aulas de EAD, os Agentes Cultura Viva e cada um fazendo da sua maneira. Essa diversidade também é o que nos nutre. Então, eu me sinto muito grata por essa parceria”, avaliou.
Segundo Pai Lula, do Ponto de Cultura Associação do Culto Afro Itabunense (ACAI), retomar a política dos pontões é um sonho e uma demanda antiga da sociedade civil. “A gente sabia desse potencial. Hoje, são essas pessoas e essas ações que estão fazendo a defesa da democracia para além da cultura, para além da Cultura Viva e para além do nosso segmento religioso ou tradicional. É importante pensar que é preciso achar ferramentas, formas e recursos para a gente dar conta da dimensão e da escala dessa política”, reforçou.
O Cultura Ancestralidade Africana no Brasil é um dos Pontões de Cultura selecionados no Edital Nº 09/2023 para desenvolver um projeto cultural por 12 meses. Realiza ações de articulação e mobilização da rede, formação e capacitação, seleção de Agentes Cultura Viva, além do Mapeamento dos Territórios Tradicionais de Matriz Africana e suas iniciativas culturais.
Além da entidade proponente (Centro de Cultural Orunmilá), esse Pontão tem um comitê gestor composto por sete Pontos de Cultura das cinco regiões do Brasil, que são referência da Política Nacional da Cultura Viva e no segmento de Matriz Africana.
São eles:
Ponto de Cultura Centro Cultural Coco de Umbigada, Olinda/PE;
Ponto de Cultura ÀGÒ LÔNÀ, Água Branca/SP;
Ponto de Cultura Associação do Culto Afro Itabunense – ACAI, Itabuna/BA;
Ponto de Cultura Ação e Tradição – Distrito Federal;
Ponto de Cultura Tambores da Igualdade, Carazinho/RS;
Ponto de Cultura Jovens Pesquisadores, Pradópolis/SP;
Ponto de Cultura Mocambo Cultura – Rede de Coletivos de Artistas e Articuladores Negros, Porto Velho/RO;
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Fonte: Ministério da Cultura