É a Constituição Federal que define a aposentadoria compulsória como pena máxima a ser imposta a um juiz e, caso se pretenda alterar essa regra, deve-se discutir uma mudança da Carta, uma modificação na legislação. A afirmação é da presidente do Conselho Nacional de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, que, durante julgamento no CNJ nesta terça-feira (28/11), declarou que há “muita incompreensão na sociedade” sobre a penalização de magistrados.
Ela defendeu que o tratamento mais adequado do Judiciário em relação a juízes e desembargadores que cometem infrações tem levado à redução da impunidade nesses casos. “O CNJ, inclusive, vem para acabar com essa cultura, para que as coisas sejam postas no devido lugar”, disse.
A declaração da presidente do Supremo se deu em meio ao julgamento do juiz Marcello Holland, afastado da magistratura desde 1992, quando foi condenado à pena de disponibilidade. Ele recorria ao CNJ contra procedimento estabelecido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo para reintegrá-lo à carreira. Holland questionava os critérios de avaliação impostos pelo TJSP e alegava tratar-se de um novo concurso público, o que seria inaceitável para um magistrado vitalício. Holland foi afastado do cargo há 25 anos porque teria recebido presentes para beneficiar políticos enquanto atuava como juiz eleitoral.
O pedido foi acolhido em parte. Por unanimidade, os conselheiros seguiram o voto da relatora, Daldice Santana, que apontou a ilegalidade em duas exigências feitas na portaria editada pelo TJSP para regulamentar o reaproveitamento de magistrados afastados. Em suma, o CNJ entendeu que a etapa da avaliação técnico-jurídica não pode ser seletiva, ao contrário do que estava previsto originalmente no ato administrativo.
Foi em meio a este debate que Cármen Lúcia aproveitou para comentar o assunto: “Ainda que haja muita incompreensão na sociedade, porque casos graves são concluídos no sentido da aposentadoria compulsória, que permite ao magistrado continuar a perceber seus proventos, estamos tentando elucidar que isso está na Constituição e, caso se pretenda uma mudança, que se mude a Constituição, a legislação”, comentou antes de proferir seu voto sobre Holland.
A disponibilidade é a segunda sanção mais grave prevista na Lei Orgânica da Magistratura – a primeira é a aposentadoria compulsória. O juiz punido com disponibilidade é afastado da função com vencimentos proporcionais. Neste caso, o advogado de Holland disse que seu cliente recebeu R$ 6 mil durante esses 25 anos.
Outro caso
Também nesta terça-feira, o CNJ começou a julgar o juiz Rafael de Oliveira Fonseca, aposentado compulsoriamente por decisão do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro em 2013 sob acusação de autorizar escutas ilegais, destruir conteúdo de gravações, vender sentença e repassar armas, carros e outros bens apreendidos pela polícia a assessores.
No CNJ, ele pede a revisão da pena imposta pelo TJ-RJ. O relator do caso, conselheiro Henrique Ávila, acolheu o pedido da defesa e votou por transformar a aposentadoria no afastamento por 2 anos. O conselheiro Rogério Nascimento, no entanto, pediu vista e o julgamento foi interrompido. Caso prevaleça a tese de Ávila, o magistrado poderá voltar a atuar imediatamente, pois já cumpriu a pena de disponibilidade de dois anos sugerida pelo conselheiro.
“A impressão que se tem é que a penalidade não levou em consideração o quanto efetivamente foi comprovado, mas sim o que constava na portaria de instauração do Processo Administrativo Disciplinar. Fosse provado tudo que está na instauração do PAD, a aposentadoria seria mais que justificada, mas não foi isso que aconteceu”, afirmou.
Ao pedir vista, Nascimento deu a entender que deve divergir do relator. “A matéria é muito complexa. Tenho que não deveríamos invadir a autonomia do tribunal na valoração da prova e gostaria de trazer isso de maneira mais consistente e fundamentada”, explicou. Cármen Lúcia disse que o adiamento é “bem-vindo”, mas também antecipou que deve manter a pena imposta pelo TJRJ. “A minha tendência é no sentido de divergir”, salientou.
Matheus Teixeira – Brasília/ Jota