Giovanni Carrigan
Especial para o Jornal de Brasília

Um dos piores problemas do Distrito Federal, o sempre arcaico transporte público da capital, tem tudo para virar um escândalo de grandes proporções. Ao investigar a concessão para a prestação e exploração do serviço básico rodoviário do Sistema de Transporte Público Coletivo do DF (STPC-DF), o Jornal de Brasília encontrou com uma série de indícios de irregularidades que serão alvo de reportagens ao longo dos próximos dias.

 

O sistema atual de transporte público, cuja ineficiência é evidenciada pelos ônibus velhos e constantemente enguiçados nas ruas, tem poucas chances de melhorar diante das irregularidades que vêm sendo cometidas desde a abertura, pela Secretaria de Transportes, da licitação que prometia mudar tudo isso. E, para piorar, é grande a chance de entrar na mira das autoridades, inclusive do Tribunal de Justiça do DF (TCDF), do Ministério Público do DF e da Polícia Federal.

 

Bacias

Gestada pelo GDF a partir de 2011, a concessão para a prestação e exploração do serviço básico rodoviário do STPC-DF dividiu, em cinco lotes (ou bacias), as rotas a serem administradas pelas empresas que vão operar os ônibus. Com valor hoje estimado em R$ 8 bilhões e permitindo a operação das linhas por dez anos, renováveis por outros dez, o edital teve vícios apontados desde sua primeira edição, em março do ano passado.

 

Depois de ser suspenso após decisão do TCDF, o processo começou a, aparentemente, andar na linha a partir do segundo semestre do ano passado, com a definição dos primeiros vencedores.   Era uma falsa impressão de normalidade. Na verdade, a concorrência tocada pela Secretaria de Transportes tem indícios de fraude, que podem beneficiar grupos que operam empresas de ônibus em várias cidades do Brasil. A primeira suspeita está na elaboração do edital. Segundo documento enviado ao TCDF pela Secretaria de Transportes, a responsabilidade pela modelagem foi do Consórcio Logit/Logitrans.

 

A Logitrans Logística, Engenharia e Transportes é uma empresa de Curitiba (PR) que tem como um dos diretores Garrone Reck. Em várias ocasiões, a empresa paranaense usa o escritório Guilherme Gonçalves & Sacha Reck Advogados Associados como consultoria jurídica para apoiar seus projetos. No DF não foi diferente, como mostram documentos expedidos pela Comissão Especial de Licitação, com pedido de auxílio para elaborar uma contestação ao mandado de segurança impetrado pela Viação Jardins, empresa eliminada da licitação. O memorando é assinado pelo presidente da comissão, Galeno Furtado Monte.

 

Interesses

Garrone Reck e Sacha Reck são, como os nomes evidenciam, pai e filho. Aparentemente, para uma empresa da iniciativa privada, usar como consultoria jurídica o escritório de um parente não significaria nada demais, não fosse por um detalhe: a banca de advocacia defende também, em várias causas, os interesses dos grupos Constantino e Gulin, que operam empresas de transporte em dezenas de cidades do País. Casos, por exemplo, das ações na Justiça de São Paulo envolvendo as empresas Transporte Coletivo Grande Bauru (do Grupo Constantino) e a Viação Cidade Sorriso (do Grupo Gulin).

 

Coincidência ou não, empresas vencedoras na concorrência em curso no DF pertencem aos dois grupos – a Viação Pioneira (do Grupo Constantino) e a Auto Viação Marechal (do Grupo Gulin).

 

As suspeitas envolvendo o transporte público do DF foram alvo de denúncia apresentada há uma semana pela Associação Brasileira de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Cidadania (Abradec) à Comissão Permanente de Licitação da Secretaria de Transportes do DF, com cópia para o TCDF, Ministério Público e Polícia Federal. Até agora, não houve resposta aos questionamentos.

 

Jornal de Brasília entrou em contato com a Assessoria de Comunicação da Secretaria de Transportes do DF, que alegou não ter condições de responder os questionamentos. Disse, porém, que as dúvidas serão esclarecidas no decorrer da semana, mediante contato. O secretário José Walter Vazquez Filho e o subsecretário José Ronaldo Persiano não atenderam as ligações.

 

Fonte: Jornal de Brasília