Reunidos para lançar um movimento contra a reforma da Previdência e contra os projetos que interferem na atividade do Judiciário, os presidentes das principais associações que representam magistrados e membros do Ministério Público aproveitaram para comentar nesta quarta-feira (31/01) os ataques da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Judiciário.

O presidente da Associação dos Juízes Federais, Roberto Veloso, afirmou que era evidente que os integrantes da Justiça sofreriam “retaliações”, pois “o julgamento de poderosos no Brasil é inédito”. Ele citou que, atualmente, políticos que ocupavam cargos relevantes e grandes empreiteiros estão presos e que é “evidente que esse trabalho” causaria uma reação. “Reagem politicamente a uma decisão jurídica. Mas foi uma decisão técnica, de acordo com o que está nos autos”, disse.

O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, José Robalinho, disse que o Brasil tem um sistema judicial sólido e que o julgamento do petista foi “técnico”. “Se os defensores do Lula estão fazendo agora esses ataques, até bem pouco atrás eram os integrantes do PMDB. Não há perseguição nenhuma, há um trabalho isento”, destacou.

Previdência

As principais entidades que representam os membros da magistratura e do Ministério Público também lançaram nesta quarta-feira uma campanha contra a reforma da Previdência e contra os projetos em curso no Congresso Nacional que interferem no trabalho do Judiciário. Em entrevista coletiva, os presidentes das associações afirmaram que o governo federal apresenta números falsos sobre a Previdência Social e desrespeita os servidores ao afirmar que funcionários públicos recebem privilégios que têm de ser alterados.

Cerca de 18 mil membros das duas carreiras assinaram um manifesto em defesa das atividades das instituições e entregarão o documento nesta quinta-feira (1/2) à presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, e à procuradora-geral da República, Raquel Dodge.

Além de comentar as mudanças na aposentadoria, os representantes das categorias fizeram duras críticas ao Projeto de Lei 8.347/2017, aprovado pelo Senado Federal e que será apreciado pela Câmara dos Deputados, que torna crime a violação às prerrogativas dos advogados.

O PL estabelece pena de um a quatro anos de prisão a quem ofender direitos da advocacia como impedir auxílio da OAB em caso de prisão, impedir acesso a documentos judiciais, afrontar a inviolabilidade do escritório ou o sigilo entre advogado e cliente, além de impedir de auxiliar seus clientes durante a investigação, entre outros.

Entidades

O presidente da Associação dos Juízes Federais, Roberto Veloso, afirmou que não há nada similar a este projeto em nenhum país do mundo. “O que se está trazendo é a imunidade absoluta dos escritórios de advocacia, o que vai dificultar a ação da polícia, do MP e da Justiça, mesmo que nesses escritórios esteja havendo prática de crimes”, destacou.

Segundo ele, isso diferenciaria os advogados de todas outras profissões, inclusive a dos magistrados, pois não há uma legislação parecida em relação a nenhuma categoria. Veloso frisou que proibir a investigação de advogados dificultaria, inclusive, a apuração dos maiores criminosos do país. “Temos quatro presídios de segurança máximo no Brasil, mas verificamos que nenhum tem segurança absoluta. Uma das falhas do sistema que permite que os líderes das facções continuem comandando o crime lá de dentro é, além da visita íntima, a entrevista com advogados”, disse.

O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, José Robalinho, destacou que, apesar de o projeto de lei de abuso de autoridade estar parado no Congresso, esse também é um dos alvos das críticas das associações. “Estamos em um momento de passar o Brasil a limpo. Esse clima com projetos que discriminam as magistraturas tem que ser denunciado para termos o apoio das instituições, como o STF e a PGR. Precisamos, também, que a opinião pública compreenda o gravidade do que está acontecendo”, ressaltou.

Sobre a reforma da previdência, ele criticou o governo federal e disse que o Executivo manipula os dados sobre o tema e que este não é o momento para debater o assunto. “Não é à toa que o governo está fracassando, pois os números são fracos, manipulados. Esse tema não pode ser discutido nesse clima de fla-flu. Tem de ser discutido com calma”, sugeriu.

O presidente da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho, Guilherme Feliciano, fez uma analogia com a Justiça do Trabalho para comentar a propaganda do governo a respeito dos privilégios dos funcionários públicos para se aposentar. “Imagino o que seria um empregador falando isso de seu empregado. É uma ofensa pública aos servidores, cheia de falácias e com dados equivocados. Nesse meio tempo, enquanto fala do rombo da previdência, o governo fez um novo Refis, perdoou dívidas, editou a Medida Provisória que beneficiou o agronegócio, entre outras medidas”, citou.

Os presidentes da Associação dos Magistrados Brasileiros, Jayme de Oliveira, da Associação Nacional dos Membros do MP, Norma Cavalcanti também participaram da coletiva. Todos fizeram questão de afirmar que a mobilização não trata do auxílio-moradia, que deve ser analisado pelo STF em março.

Outro lado

Por meio de nota, o advogado de Lula, Cristiano Zanin, afirmou que recebeu com “preocupação” as manifestações das associações. “Membros do Judiciário e do Ministério Público não deveriam se unir por meio de associações corporativas para tratar de casos concretos em julgamento, até porque isso é incompatível com o Estado Democrático de Direito e com as garantias fundamentais que tais entidades dizem defender em seus respectivos estatutos”, criticou.

Além disso, disse que o presidente da Ajufe não foi fidedigno às palavras do ex-presidente. “Ele (Lula) jamais se recusou a cumprir decisões judiciais por mais injustas que fossem. O ex-presidente sempre respeitou as instituições e os depoimentos coletados em ações judiciais reforçaram atos concretos praticados durante o seu governo para fortalecê-las. Isso não lhe retira o direito de criticar decisões judiciais proferidas no âmbito de processos marcados por flagrantes nulidades e desrespeito à lei, como ocorreu no chamado caso do ‘tríplex’, sem prejuízo da impugnação pela via jurídica adequada por meio de sua defesa técnica”, ressaltou.